quarta-feira, 13 de abril de 2011

UMA CRÔNICA PARA SE PENSAR O ENSINO DE CIÊNCIAS

Sabia rastrear pegadas como ninguém e, olhando as marcas deixadas no chão, era capaz de saber se quem por ali passara fora gato, gente ou cachorro e, pela maneira como ficava a impressão, era até capaz de dizer se bicho grande ou pequeno, se homem ou mulher.

Sabia muitas histórias, e a todo o momento propunha charadas, apresentava desafios, sugeria brincadeiras. Foi com ele que aprendera a lamber, descobrindo paladares diferentes e, mesmo com uma venda nos olhos, transformar-se em um verdadeiro craque, diferenciando o gosto de uma fruta na primeira lambida, a diferença entre o sabor exótico de uma carambola e o sabor melado da jaca, e até os incríveis temperos usados por vovó nas comidas que fazia. Não parecia que ensinava, mas era Ciências que ensinava.

Melhor que ninguém sabia subir em árvores, mesmo as mais altas, balançando-se em seus galhos e delas descendo com a camisa carregada de frutas e jamais voltava de uma caminhada pelo campo sem trazer flores para vovó, que delas gostava tanto. Mas não trazia sempre as mesmas flores, sabendo compor diferenças e explicar que cada uma, tal como as pessoas, possuía personalidade própria e gostos especiais: Pedro aprendera das flores que gostavam do sol e das que preferiam a sombra, das que não passavam dias sem água e por isso iam morar sempre perto do regato, e de outras que queriam fugir dessas baixadas, escolhendo solos mais secos e pedregosos, sempre "beijadas" por muita luz. Sabia uma incrível quantidade de nomes de plantas silvestres, e para qualquer dia do ano era capaz de adivinhar sem erra a hora de nascer e do pôr do sol. Pedro nem imaginava que o que sabia era Ciências. Foi graças a ele que Pedra aprendeu a nadar, flutuar e mergulhar bem fundo, reaparecendo à tona em lugares mais distantes. Aprendeu também a respeitar os animais, as pessoas, os insetos, as flores, e descobrir que a diversidade é a grande razão de ser bela a natureza. Antes de aprender com ele, Pedro pensava que o verde era o verde e pranto, mas descobriu que existiam dezenas de verdes e que uma mesma cor, quando molhada ou seca, acariciada pelo solou escondida na sombra, tornava-se diferente. Pedra jamais o viu de mau humor e mesmo em momentos mais difíceis, não via razão para não ser educado, sorridente e alegre com todos. Possuía especial capacidade de descobrir qualidades em pessoas, fazendo dessa observação sempre um elogio sincero. Conhecia uma porção de letras musicais e ensinou a Pedro a inventar trilhas sonoras para as mais diferentes situações, e a descobrir músicas boas para jogar bola, músicas interessantes para descansar à tarde, músicas atraentes para se inventar uma letra que se associava ao caminho que se andava, as pessoas que conhecia: - Qual a música que nos lembra "seu" Reginaldo com seus passos sempre largos? Quais sugerem os incríveis bolinhos de arroz, preparados pela vovó? Realmente, Tio Roberto era um fantástico professor de Ciências.

Ciências e Didática -Coleção Como Bem Ensinar-
Ed. Vozes.

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